O abraço

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O abraço: tão trivial na cultura brasileira, é um gesto carregado de sentidos. Demonstra afeto, afago, simpatia, boas vindas, colo, carinho, calor humano... É justamente por demonstrar tantos sentimentos bons, que devemos usá-lo com cuidado. Muitas pessoas se incomodam pelo fato de eu não ser muito adepta do abraço, acham antipático da minha parte. Depois que comecei a desenvolver formas de demonstrar que não abrirei meus braços na direção de pessoas pouco conhecidas ou cujo relacionamento somente ocorre informalmente, percebi que este é um gesto tão naturalizado socialmente, que meus interlocutores ficam sem reação ao perceberem meu não sinal. Contudo, desenvolver "olás" e "tchaus" coletivos tem sido uma experiência pessoal muito importante, no que diz respeito à sinceridade de relações, cumplicidade e amizade verdadeira.

Quando somos crianças não temos muito crivo daquilo que é socialmente aceito. Cabe aos nossos cuidadores - pais, mães, avós, professoras, etc. - nos instruir sobre como devemos nos comportar em ambientes públicos ou com pessoas desconhecidas. E dá um nó na cabecinha dos pequenos quando seus pais ou cuidadores dizem "não falem com estranhos", "não aceite convite de desconhecidos", mas, por outro lado os obrigam a abraçar ou beijar pessoas que lhes são estranhas e desconhecidas. Ou ainda, abraçar e beijar pessoas que, mesmo conhecidas, não transmitem segurança afetiva para as elas. A criança possui uma sinceridade pueril, livre de julgamentos, que parece a defender de aproximações impróprias, mas que, muitas vezes é dogmatizada pelos adultos que as criam.

Atualmente, muito também se instrui os pequenos sobre seus espaços pessoais próprios. A fim de evitar abusos e maus tratos, ensinam-lhes onde elas podem ou não podem serem tocadas. E em se tratando de espaço pessoal, acho nada mais justo e válido que elas também sejam capazes de discernir um abraço amistoso, de quem bem lhes quer, daquele outro abraço que só é dado para cumprir uma obrigação que lhes é imposto socialmente ou que vem cheio de segundas intenções.

Aproveitando o advento do Dia das Crianças celebrado no último dia 12 para revisitar minha criança interior e o fato de que faz algum tempo venho exercitando um abraço mais seletivo, compartilho um pouco de minhas ideias. O abraço é tão íntimo quanto um beijo. Os corpos se aproximam, sente-se o calor, os cheiros e as sensações de quem lhe abraça. Muitas vezes, não se tem ou não se deseja tanta intimidade com pessoas que mau se conhece ou que se conhece bem a ponto de não querer se aproximar. Um sorriso, um olá, um aperto de mão já seria suficiente para demonstrar educação, simpatia e respeito, e, assim, busco fazer. Há não muito tempo atrás surgiu uma campanha nas redes sociais, solicitando aos adultos que não forcem suas crianças a beijarem ou abraçarem pessoas com quem elas não se sintam à vontade, justamente para que se respeite seu espaço individual e sua compreensão de mundo. Meu apelo é que nós, adultos, também não nos forcemos e compreendamos melhor o espaço individual de cada um - seja criança, adolescente, ou mesmo adulto - para que o abraço recebido não seja algo forçado, impositivo e de mau grado. Mas que, pelo contrário, quando for abraçar alguém, que seja um gesto de extremo respeito, simpatia, bem querer e sobretudo, sincero.

Shirley Silva Costa
Psicóloga - CRP 07/27644
@psicologiatodosdias

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